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STF se rende às empresas de comunicação

Por Nonato Viegas

ATUALIZADO EM 19/6

Comentário de Carlo José Napolitano, advogado e professor universitário, em Bauru (SP).

“Infeliz a decisão do STF de acabar com a exigência do diploma de jornalismo para o exercício da profissão. Infeliz pois afronta o texto constitucional (“é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer’).

Infeliz pelos argumentos: agora jornalista é igual a cozinheiro, segundo o ministro Gilmar Mendes. E, segundo o ministro Cezar Peluso, o diploma só é necessário em profissões que exigem o domínio de “verdades científicas”.

Todo aluno de primeiro ano do curso de direito sabe que essa é uma ciência onde não há “verdades científicas”. Nesse sentido, segundo o entendimento do ministro Peluso, para ser juiz, promotor, advogado etc. não é mais preciso frequentar um curso de direito.

Infeliz pois essa definição deveria ficar a cargo do Legislativo, e não do Judiciário, que, mais uma vez, se intrometeu em um assunto que não lhe diz respeito.”

Sobre o fim da necessidade de formação específica para o exercício do jornalismo, duas questões:

1) o argumento de que em outros países como EUA e Inglaterra também não há a exigência de formação é uma falácia. Lá, existem entidades que fiscalizam o exercer do profissional, aos moldes do que seria o CNJ. Mas, aqui, as empresas disseram se tratar de tentativa de censura do Lula.

2) afirmar que exigir formação específica fere a liberdade expressão é um escárnio! a) repórter não expressa opinião, a menos que o dono do jornal (TV e rádio) permita. Portanto, dizer que extinguir a formação é dar liberdade é mentira; b) qualquer cidadão pode e deve se manifestar em crônicas, colunas, cartas, e-mails em veículos de comunicação. Reportar é diferente de expressar opinião.

“Uma terra sem lei”, diz o jornalista Ricardo Kotscho sobre a decisão do STF. “Com o fim da lei de Imprensa, que todos queriam, e da regulamentação da profissão, sem colocar nada no lugar, o exercício do jornalismo agora virou uma terra sem lei”, diz. Para ele, a “discussão deveria prosseguir para que alguma regra do jogo seja estabelecida, em defesa das empresas e dos profissionais sérios e, principalmente, dos cidadãos, do conjunto da sociedade”.

O diretor de Redação do Correio Braziliense e Estado de Minas (Diários Associados), Josemar Gimenez, diz que continuará a contratar “apenas pessoas com formação”. A opinião do executivo, no entanto, contraria a de outras empresas. “Folha de S. Paulo” até enviou a própria advogada, Taís Gasparian, para representar a ANJ (Associação Nacional de Jornais) e o Sindicato das Empresas de Rádio e Televisão de São Paulo na defesa do fim da exigência da formação específica.

Já a entidade que representa os jornalistas profissionais, a Fenaj, por Roberto Piza, acredita que a não exigência do curso de jornalismo correspondia a interesses “corporativos do patronato”.

A TV Globo, por exemplo, celebrou a relatoria de Gilmar Mendes, com direito a entrevista com o presidente do STF, por Heraldo Pereira.

O futuro da mídia: blog ou impresso IV?

No quarto capítulo (leia o primeiro, segundo e terceiro capítulos), do debate sobre o futuro da mídia, Paul Starr pondera a possibilidade de lixos e desinformação gerados pela ausência de uma mídia impressa forte.

17 de abril de 2009

Prezado Steven,

Que tal olharmos mais de perto a seu negócio, o Outside.in, e ver se funciona como substituto do jornalismo profissional.

Vejo que, quando você lançou o Outside.in, em outubro de 2006, empregou o mesmo exemplo do projeto Atlantic Yards. Dois anos e meio já se passaram desde então, e tenho certeza de que você já deve ter outro. Mas qualquer pessoa que navegue por seu site verá que ele não faz reportagem investigativa. Pelo que pude apreender, ele não faz nenhum trabalho de reportagem próprio. Ele agrega o que aparece em outros lugares. Não parece haver qualquer critério de relevância ou importância. E, se o que aparece em outros lugares é lixo, o site ajuda a difundir esse lixo, porque, por sua própria natureza, um site de notícias automatizado não possui aquilo que tem todo bom editor: um detector de lixo.

Você se refere a um blog chamado Atlantic Yards Report como uma das fontes chaves das notícias sobre o Brooklyn publicadas no Outside.in.

Chequei essa informação com o editor do Report, Norman Oder. Eis o que ele disse em resposta à pergunta de se o Outside.in faz qualquer trabalho de reportagem ou exerce qualquer seleção editorial: “O Outside.in não ‘cobre’ o Atlantic Yards e, a meu ver, não exerce virtualmente nenhum impacto sobre a discussão local. Ele apenas agrega uma multidão de cobertura noticiosa e de blogs, pegando carona especialmente no meu blog e no portal NoLandGrab.org”.

É claro que você não paga Oder ou qualquer outra pessoa pelo uso de seu trabalho. Isso pode ser um bom modelo econômico. Mas, se é um modelo para resolver os problemas do jornalismo, isso é outra história.

Vamos também olhar mais de perto o discurso que você vem usando para colocar-se como corajoso defensor da inovação. Você diz que eu “quero agir para preservar um modelo de jornalismo impresso”.

Mas, como deixei claro num artigo recente, “Adeus à Era dos Jornais” [publicado em 4/3 na “New Republic”], precisamos buscar novas formas de jornalismo adaptadas às exigências de um ambiente digital, aproveitando plenamente as vantagens deste. O problema é que o tipo de inovação que você está promovendo não responde com eficácia ao problema triplo que mencionei: financiar o jornalismo de serviço público, engajar o público e gerar responsabilidade política.

Sites como o seu, que tiram notícias, comentários –e lucros– da web dependem inteiramente de que outros paguem pelo trabalho original de reportagem. Alguns blogueiros podem dar furos jornalísticos ocasionais, mas fazer de conta que eles possuem as capacidades de um grande jornal metropolitano é enganoso.

Um site que tira notícias de outros lugares pode ampliar o público do material que coleta, mas, se existe algum efeito de engajar o público, isso acontece porque outros estão fazendo o trabalho. Engajar o público requer que se identifiquem os acontecimentos e apontem seu sentido, e não apenas que se reproduzam informações (e desinformações) isoladas.

Finalmente, criar responsabilidade política efetiva requer um poder compensatório da imprensa que um site que tira notícias de outras fontes não terá. Quando falei de jornais reduzindo sua produção e da incapacidade de o jornalismo on-line preencher essa brecha, eu estava me referindo à cobertura do governo estadual em Nova Jersey. Isso é verdade, e se aplica também à cobertura dos governos de outros Estados.

Nada do que você disse propõe soluções para essa diminuição da cobertura jornalística e suas implicações para a responsabilidade política, e seu site com certeza não é uma solução –você não pode agregar artigos que não estão sendo escritos.

Para resolver esse problema serão necessários novos investimentos em jornalismo por parte de organizações sem fins lucrativos, novos modelos econômicos que financiem o jornalismo e novas políticas públicas que permitam a organizações noticiosas captar uma parte maior da receita do bem público que produzem.

E, já que estamos falando em receita, que tal pagar a Norman Oder e outros pelo trabalho que você vem divulgando como se fosse a contribuição de seu próprio site ao debate público?

Paul

‘Folha’ briga com ‘Congresso em Foco’ e é questionada… de novo

Por Nonato Viegas

O jornal “Folha de S.Paulo” está na berlinda. De novo. Desta vez, quem o questiona é o site “Congresso em Foco”.

Depois de usar os furos do site, de onde partiu a maior parte das denúncias sobre o mau uso por congressistas das passagens aéreas, a “Folha”, na edição de sábado, escreveu sobre os supostos “financiadores” do blog.

Diz a matéria, que não é assinada: “[O site] Faz parte do grupo da assessoria de imprensa Oficina da Palavra, que tem como clientes a Brasil Telecom, a Eletronorte, o TCU e a Escola Superior do Ministério Público.”

O jornalista Silvio Costa, dono do blog, responde  que é “incorreto vincular o site ‘Congresso em Foco’ (…) a atividades de ‘assessoria de imprensa’ realizadas pela Oficina da Palavra”. Diz que “é sustentado pelas receitas geradas pelo iG, portal que o hospeda, por publicidade e por projetos especiais, observando sempre a prática de estampar nas suas páginas, de modo claro, os nomes dos seus anunciantes, patrocinadores e parceiros comerciais ou institucionais”.

Costa, que já trabalhou na “Folha”, diz que tentou ser elegante ao não falar ao jornalista que o procurou que só conseguiu montar o site porque ganhou “uma bolada” do jornal, depois de reivindicar – e ganhar – na Justiça direitos trabalhistas e lembra a crise por que passa o “maior jornal” do país.

Estar no ar, desde ontem, as críticas do “Congresso em Foco” (leia aqui) à apuração da “Folha”.

O Arena já publicou a crise de credibilidade por que passa o jornal dos Fria, que teve o pior trimestre da última década, informa o IVC (Instituto Verificador de Circulação), segundo quem o diário fechou o primeiro trimestre de 2009 com média diária de 298.351. No começo de 2000, essa média era de 429.476.

Também o Arena já mostrou a guerra travada entre o jornal e a TV Record e lembrou que o jornal mentiu sobre a atuação de Dilma Rousseff na ditadura, além de ter considerado a Ditadura Militar no Brasil uma “ditabranda”.

 

leia mais:

‘FOLHA’ MENTE E PASSA POR CRISE DE CREDIBILIDADE

‘FOLHA’, ‘ESTADÃO’ E ‘O GLOBO’ DESABAM

‘FOLHA’ DÁ CAPA A FICHA FALSA CONTRA DILMA

O futuro da mídia: blog ou impresso III?

No terceiro capítulo (leia o primeiro e o segundo) do debate sobre o futuro da mídia, Steven Johnson rebate as críticas de Paul Starr, que vê nas proliferação dos blogs como um risco à cidadania.

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16 de abril de 2009

Caro Paul,

É verdade que sou otimista quanto às possibilidades de longo prazo do jornalismo, mas a última coisa que quero fazer é incentivar a “inação”. O objetivo todo de meu argumento é sugerir um futuro otimista e inspirar as pessoas a construí-lo. Você quer ação para preservar um modelo de jornalismo de jornais que nos serviu bem durante um século. Eu acho que podemos construir algo melhor.

Você fala das forças de longo prazo que se alinharam contra os jornais. Elas são reais. Mas você passa por cima de muitas das forças compensatórias –políticas, econômicas e tecnológicas– que beneficiam o jornalismo e também a cultura cívica que o cerca.

Hoje vemos novas e vastas eficiências na distribuição, graças à passagem da imprensa impressa à digital. Existem oportunidades inusitadas de participação na criação, curadoria e discussão das notícias. O acesso às informações governamentais se tornou mais fácil, graças em parte a iniciativas de transparência como as tomadas pela administração Obama.

Enquanto isso, novos sites –incluindo um que eu criei, Outside.in– permitem aos cidadãos tratar de questões “hiperlocais” ao nível de quarteirões e bairros das cidades, coisas que os jornais de cidades jamais poderiam alcançar.

Tudo isso vem acompanhado da capacidade de agregar muitas vozes diferentes num único site, sem pagar pelos custos de criação desse conteúdo. E não se esqueça dos US$ 10 bilhões de publicidade local que virão on-line nos próximos cinco anos.

Mas não falemos das tendências de longo prazo. Falemos sobre o que está acontecendo agora mesmo em minha cidade natal, Brooklyn.

Você fala do declínio da cobertura jornalística do governo estadual em Nova Jersey. Nos últimos três anos, a questão cívica dominante em Brooklyn tem sido a polêmica em torno de um grande projeto de reurbanização, o Atlantic Yards.

No Outside.in, a página dedicada ao Atlantic Yards reúne notícias, reportagens, comentários e bate-papo. Nos últimos cinco dias saíram 30 artigos. A edição impressa do “New York Times” publicou exatamente uma matéria nos últimos 30 dias mencionando o assunto.

Quão mais rica será a cobertura de uma questão pública importante como o Atlantic Yards nos próximos cinco anos? Como você diz, é arriscado dar um palpite, então imaginemos um futuro baseado inteiramente em empreendimentos e sites já existentes.

Eis o que eu acho que existirá. Grandes bloggers, como o blog imobiliário do Brooklyn Brownstoner, vão apresentar notícias pela primeira vez, comentar acontecimentos e até ganhar dinheiro. Plataformas de dados como Everyblock vão informar as pessoas sobre novos empreendimentos imobiliários. Pessoas e sites com paixão por trazer fatos escusos à tona –como o corajoso blog Atlantic Yards Report– vão comparecer a todas as audiências públicas para formular perguntas difíceis e vão postar na internet transcrições das audiências, com comentários adicionais. Amadores locais vão vasculhar documentos públicos em busca de detalhes reveladores, e pais presentes às audiências escreverão em blogs sobre o impacto sobre escolas específicas à sombra do projeto. E sites como o Outside.in vão circular as observações deles a leitores que vivem nessa zona escolar, enquanto novas organizações beneficentes como a Spot.us vão financiar artigos investigativos sobre o histórico passado das empresas envolvidas na construção.

Se forem espertos, jornais de Nova York como o “Times” e o “Post” vão aproveitar essa cobertura, compartilhá-la com seus leitores, usá-la para vender anúncios locais e às vezes colocar um de seus repórteres treinados para desenvolver artigos novos.

Estes últimos, por sua vez, acrescentarão valor enorme à cadeia de informação, e o ciclo inteiro recomeçará.

Sim, é verdade que no final desse processo haverá menos jornalistas oficiais de jornais cobrindo acontecimentos como o Atlantic Yards. Mas haverá um declínio correspondente no engajamento cívico público? Não acredito. Você fala sobre o velho sistema dos jornais aumentar o engajamento em parte porque as pessoas tropeçavam na primeira página a caminho das páginas de quadrinhos. Eu nem sequer aceito essa premissa. Desconfio que a web vai mostrar-se muito mais afortunada que os jornais impressos. Mas, mesmo que não o seja, qual sociedade lhe parece incluir mais participação cívica? Uma em que o noticiário é controlado por uma pequena minoria e onde as interações cívicas das pessoas acontecem como leitura feita a caminho da seção de esportes? Ou uma em que milhares de pessoas comuns participam ativamente na criação do próprio noticiário?

Steven

O futuro da mídia: blog ou impresso II?

Em resposta a Steven Johnson (leia o início do debate), Paul Starr vê risco ao exercício da democracia a crise por que passam os veículos impressos.

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Por Paul Starr

10 de abril de 2009

Caro Steven,

Concordo que um novo modelo de noticiário e controvérsia pública está emergindo on-line e que sob alguns aspectos, especialmente a gama de opiniões que abrange, o ambiente on-line apresenta vantagens em relação ao mundo tradicional do jornalismo impresso.

Mas a realidade é que os recursos para fazer jornalismo nos EUA, especialmente nos níveis metropolitano e regional, estão desaparecendo mais rapidamente do que as novas mídias conseguem gerá-los.

Você emprega a metáfora de um “ecossistema”, e é um conceito reconfortante: à medida que morrem as formas de vida velhas, nascem outras novas.

Mas você está tomando algumas árvores por uma floresta. Vamos tomar cuidado com as extrapolações que atendem aos nossos desejos.

Se uma região de um país sofre chuvas pesadas e outra enfrenta uma estiagem, a presença de chuva em algumas áreas não me faz inferir que amanhã os desertos vão verdejar –não sem irrigação, pelo menos.

Além disso, a própria metáfora orgânica induz ao engano. As mídias não se desenvolvem naturalmente. Elas se desenvolvem historicamente, e as forças que regem seu desenvolvimento são sobretudo políticas e econômicas.

A maioria das sociedades, mesmo aquelas que têm uma imprensa nacional livre, não possui a abundância de mídia metropolitana que historicamente caracteriza os EUA. A imprensa no Reino Unido e na França, por exemplo, é muito mais concentrada no nível nacional.

Mas nos EUA, desde a fundação da república até o século 19, a política governamental subsidiou a ascensão de jornais locais. Esses jornais, por sua vez, exerceram papel econômico importante como intermediários entre os vendedores (anunciantes) e os compradores. A partir desses lucros, os jornais puderam subsidiar a produção de notícias como bem público. De fato, os jornais diários metropolitanos têm sido a maior fonte de cobertura noticiosa original nas cidades norte-americanas.

Essa função tem sido especialmente crítica nos EUA, porque, num sistema federal como o americano, funções públicas vitais são confiadas aos governos estaduais e locais.

A democracia depende da cobertura noticiosa independente de todos os níveis de governo, especialmente os níveis que respondem diretamente aos eleitores. As pesquisas em ciências sociais mostram que, onde a mídia noticiosa é fraca, a corrupção está muito mais presente. Sem uma imprensa independente capaz de cobrar responsabilidade dos governos locais e estaduais, o projeto básico de uma democracia federal fica comprometido.

A internet está enfraquecendo a capacidade da imprensa de subsidiar a produção de jornalismo de serviço público, e isso por uma razão, sobretudo.

Os jornais diários metropolitanos já não ocupam a posição estratégica de intermediários entre compradores e vendedores que ocupavam no passado; existem maneiras alternativas, on-line, para os vendedores chegarem a seus mercados e para os consumidores encontrarem informações sobre produtos e vendas.

A competição crescente para chamar a atenção dos leitores no ciberespaço também enfraquece a capacidade de a mídia noticiosa cobrar por seus conteúdos. A recessão atual e, em alguns casos, a administração insensata vêm agravando esses problemas, gerando cortes draconianos tanto no quadro de profissionais das Redações quanto na profundidade da cobertura jornalística.

Jornais na Europa e outras regiões enfrentam as mesmas transformações estruturais graves, à medida que a internet prejudica suas fontes de receita.

Nos EUA, a cobertura jornalística dos governos estaduais vem caindo de maneira nítida. Em meu próprio Estado, Nova Jersey, antigamente havia 50 repórteres que cobriam a política em tempo integral. Hoje esse número caiu para 15. Muitas notícias nem sequer chegam a ser cobertas.

Contrariamente ao seu relato, o recuo dos jornais não vem sendo compensado por uma tendência de veículos on-line preencherem a brecha criada.

Alguns sites de jornalismo estão se desenvolvendo em Estados e cidades em outras partes do país, mas quase todos operam em base sem fins lucrativos e em escala muitíssimo menor que a dos grandes jornais diários americanos.

Existem na realidade três problemas separados aqui: 1) a produção de notícias feita com profissionalismo; 2) a produção de um público engajado; e 3) a produção de responsabilidade política efetiva.

Embora seja inquestionável que a internet oferece uma diversidade de opinião e acesso a novas fontes, ela não vem conservando o jornalismo profissional generalista em seus níveis anteriores.

Estão sendo servidos alguns públicos de nicho. No nível nacional, ao mesmo tempo em que o número de jornalistas da mídia generalista profissional vem diminuindo, muitos jornalistas têm encontrado trabalho em publicações de preço elevado que atendem a setores econômicos específicos. A indústria petrolífera, estou certo, receberá informações confiáveis sobre os fatos ocorridos em Washington. Mas não é igualmente certo que o público em geral receberá informações igualmente boas sobre a influência política da indústria petrolífera. E essa privatização do jornalismo provavelmente será ainda maior nos níveis estaduais e locais.

A filantropia poderá subsidiar a reportagem investigativa e remediar esse problema parcialmente. Mas o segundo problema –a criação de um público engajado– é ainda mais difícil. Os jornais, que no passado eram lidos por metade das pessoas de uma cidade, ajudavam a criar um público urbano consciente. Aqueles que compram um jornal podem interessar-se sobretudo pela seção de esportes ou a página das palavras cruzadas, mas, mesmo assim, olharão a primeira página pelo menos de relance, com isso tomando conhecimento de algo sobre sua cidade e o mundo.

On-line, as pessoas que se interessam por esportes ou palavras cruzadas vão diretamente aos sites que os oferecem, evitando ser expostas a notícias e polêmicas sobre suas comunidades. A informação incidental que se ganha com um jornal metropolitano inclusivo deixa de existir.

O impacto dessa mudança provavelmente irá variar segundo o nível de renda, de instrução e de interesse político dos leitores. Os mais ricos, mais instruídos e mais politizados possuem os recursos e a motivação necessários para procurar informações on-line, mas esse não é o caso de muitos outros.

O que está em jogo aqui é o desenvolvimento maior de uma sociedade de informação estratificada. Os EUA já vêm assistindo a um aumento tremendo na disparidade social nas últimas décadas, e qualquer pessoa que se preocupe com a justiça e o futuro da democracia deveria preocupar-se com outros desenvolvimentos que ameaçam agravar essas tendências.

Isso guarda relação com o terceiro problema: a criação da responsabilidade política efetiva. A capacidade da mídia noticiosa de servir como freio ao governo não depende apenas das leis que protegem a liberdade de expressão, mas também do poder econômico da imprensa. Interesses poderosos podem intimidar organizações que sejam financeiramente fracas.

Seria insensato prever se a internet vai ou não, em última análise, ser capaz de sustentar o tipo de jornalismo para o público geral que os jornais têm produzido, historicamente.

Mas seria ainda mais insensato ignorar as evidências do que está acontecendo hoje e confiar numa visão feliz de progresso inexorável proporcionado pela internet.

O perigo dessa indiferença alegre às realidades desagradáveis é que ela pode nos induzir à inação. Tanto a política governamental quanto a filantropia precisam ser incentivadas a apoiar o jornalismo independente de maneiras novas.

Espero que você se convença a reconhecer essa necessidade.

Paul Starr

Nova cultura da mídia muda valor de conteúdo

Por Cleyton Melo (Gazeta Mercantil)

Doutor em sociologia pela Universidade de São Paulo e professor da pós-graduação da Faculdade Cásper Líbero, na capital paulista, Marcelo Coutinho é um estudioso do impacto da tecnologia na economia e na comunicação. Além da experiência acadêmica, seu olhar sobre as mudanças na mídia é lapidado pelo trabalho como diretor de análise de mercado do Ibope Inteligência. Nos últimos anos, tem se dedicado a estudar dois campos que, entre tapas e beijos, parecem fadados a um casamento inadiável: a internet e o setor de mídia. Enquanto a primeira avança e transforma a sociedade, o segundo tenta adaptar seu modelo de negócios aos novos tempos. “O que as empresas de comunicação pensam ser uma ameaça, na verdade é uma oportunidade”, diz Coutinho. “Elas têm a possibilidade de repensar um modelo de negócios no qual o conteúdo desempenha um papel central e que leva a sociedade a se mobilizar em torno disso”, reforça o pesquisador, que prefere não ter web em casa para que, aos finais de semana, possa se dedicar a livros, jornais revistas – todos impressos, que fique bem claro.

GAZETA MERCANTIL – O senhor já afirmou em outra ocasião acreditar que a profundidade das transformações provocadas pelo digital será maior nos próximos dez anos do que o foram na última década. Por quê?

MARCELO COUTINHO – Isso se deve, por um lado, a aspectos quantitativos. Embora não tenha as estatísticas precisas aqui, é fato que o número de usuários de internet no final dos anos 1990 era muito menor. Vamos chegar ao final desta década numa situação muito diferente no mundo. No caso do Brasil, dados do Comitê Gestor e de institutos como o Ibope e o Datafolha apontam para algo entre 60 milhões e 65 milhões de usuários. Algo como 30% da população brasileira. Já é um fenômeno numericamente expressivo. Só que muito mais importante é o fator qualitativo. Estamos assistindo, com o surgimento da economia colaborativa, à possibilidade de uma nova cultura midiática. Embora a cultura da mídia ainda seja muito passiva, com a maior parte dos consumidores recebendo passivamente o conteúdo, vemos nos jornais, na TV e na própria web que as pessoas querem interferir e interagir com o conteúdo de alguma maneira. Há um fenômeno que o pesquisador Henry Jenkins, do MIT, chama de a cultura do fã. O que é isso? É a possibilidade de as pessoas interagirem e rediscutirem aquele conteúdo. É a ideia da calda longa trazida para o mundo do conteúdo. Explico: milhões de pessoas serão impactadas pela série Lost na TV, e alguns milhares de espectadores vão prolongar a vida desse conteúdo por semanas ou até meses, na medida em que discutem esse material. Veja – e por isso digo que provavelmente as transformações serão mais acentuadas nos próximos dez anos – que o controle do conteúdo e das marcas publicitárias começa a sair da mão das grandes organizações produtoras de conteúdo. Não acho que o modelo “broadcast” – conteúdo feito por grandes grupos econômicos para atrair audiência e, assim, gerar receita publicitária – vá desaparecer, é bom destacar. Mas, se esse sistema reinou sozinho praticamente durante toda a segunda metade do século XX, agora ele vai ter de conviver com outro modelo, que é o de produção de conteúdo na “calda longa dos fãs”. Ou seja, o conteúdo que uma organização produz também tem de ser pensado como um produto que pode ser trabalhado, recriado e rediscutido por pessoas que tenham alguma relação com uma marca.

GAZETA MERCANTIL – O que o senhor descreve é exemplo da narrativa transmidiática da qual fala Jenkins, experimentada por séries de TV como Heroes e Lost ou Matrix, no cinema.

MARCELO COUTINHO – Exatamente. Esses são bons exemplos. Talvez mais importante que impactar uma grande massa de pessoas, será se aproximar daquele grupo que tem uma relação profunda com o conteúdo que sua empresa torna disponível. Isso nos faz pensar numa outra coisa: o que as empresas de mídia pensam ser uma grande ameaça, na verdade pode ser uma grande oportunidade, que talvez só tenhamos visto na época do aparecimento da televisão.

GAZETA MERCANTIL – Que oportunidade é essa?

MARCELO COUTINHO – É a possibilidade de repensar um modelo de negócios no qual o conteúdo desempenha um papel central e que leva a sociedade a se mobilizar em torno disso. Aqui entramos no terreno das redes sociais: para que serve o conteúdo, a informação? Para gerar prestígio social. Por que uma notícia de jornal ou um filme visto na TV, na web, são importantes? A importância vai além do fator econômico, é também social. As pessoas conversam sobre o conteúdo. Ao conversarem sobre ele, contribuem com o mercado social – reforçar os laços de amizade, prestígio dentro de um determinado grupo. Tudo isso já ocorre muito antes da web. Mas a digitalização possibilita às empresas produtoras de conteúdo rastrear esse conteúdo, coisa que não podiam fazer antes. O que veremos nos próximos dez anos é o rastreamento e a mensurabilidade desse marketing viral. E a possibilidade de medir como isso impacta no comportamento das pessoas. Este é o desafio das empresas de mídia e das agências de publicidade: sair de um modelo de negócio baseado exclusividade na exposição do conteúdo para um calcado no impacto do conteúdo. Em outras palavras, na circulação do conteúdo nas diversas redes sociais.

GAZETA MERCANTIL – Pode dar um exemplo adequado ao contexto de um jornal ou revista?

MARCELO COUTINHO – Gosto de citar o “The New York Times”. Se você perguntar para qualquer pessoa da minha geração, de 40 anos para cima, qual é o slogan do “NYT”, ela dirá “all the that´s fit to print”, ou seja, tudo o que um grupo de editores julgou adequado ser impresso. E qual o slogan do NYT na internet? “Onde as conversas começam”. Isso é muito bem sacado e demonstra a compreensão dos mecanismos que estão diante da mídia. Mais que algum conteúdo para ser impresso e distribuído, busca-se um material que circule entre as pessoas. Como isso pode ser feito e medido? Esse é o Santo Graal que todo mundo persegue. Temos de um lado um mercado de conteúdo produzido por grandes corporações. De outro, um mercado social (os Orkuts, os LinkdIns, os Twitters da vida) no qual os conteúdos circulam. O desafio é fazer com que o conteúdo produzido no mercado econômico também seja medido no mercado social e passe a ter um valor financeiro dentro desse mercado social. Exemplo: existe alguma maneira de gerar receita com uma notícia da interessante da Gazeta Mercantil que eu leve para meu Orkut, Facebook ou Twitter? Acho que existe, mas ainda não conseguimos encontrá-la. A indústria da mídia se encontra diante da mesma oportunidade que surgiu com o aparecimento da televisão. Mas ficar demonizando as mudanças não resolve. Tem de encontrar uma solução.

GAZETA MERCANTIL – Por que as transformações provocadas pelo digital são tão poderosas?

MARCELO COUTINHO – Porque elas vêm do consumidor. O Ibope Inteligência divulgou duas pesquisas. Uma foi feita no evento de tecnologia Campus Party, em janeiro, e outra agora, sobre a relação dos jovens das classes ABC com as marcas de material esportivo. Esses estudos mostram que, para esse público (que não está na média dos consumidores brasileiros, pois são adolescentes e fissurados em tecnologia), a importância da opinião de outros consumidores é mais importante que a comunicação de massa dos meios tradicionais, como a publicidade em TV, rádio etc. Isso como fonte de informação para decisão de compra. Você pode dizer que hoje eles são adolescentes. Mas, durante a próxima década, esse pessoal vai ingressar com tudo no mercado de consumo.

GAZETA MERCANTIL – O senhor falou que o conteúdo continuará a ser um item muito importante no cenário que se desenha para o mercado da comunicação. Mas que tipo de conteúdo é esse que será valorado? Quais as perspectivas para a produção jornalística?

MARCELO COUTINHO – O conteúdo tem relevância na medida em que ele é uma moeda social. É o fato de ter acesso a um material interessante, diferente e reproduzi-lo em uma rede, que pode ser digital ou não – é preciso entender que há as redes sociais que não são digitais. As pessoas falam das redes sociais como se elas tivessem surgido com a internet. Mas a sociologia começou a estudá-las por volta de 1890. A novidade é que elas passaram a ser mensuráveis a partir da digitalização. Então, que conteúdo é importante? Claramente percebemos que é aquele que vai além da instantaneidade. De que me vale ver na capa de um jornal a seguinte manchete “Obama é eleito”. Não faz sentido. Vamos analisar o assunto por partes. Pense no jornalismo hard news (notícias factuais), que pode ter alto impacto, mas tem vida útil curta. Esse tipo de conteúdo será comercializado talvez por um grupo muito restrito de organizações internacionais com escala para uma produção global. Estamos falando de dois, talvez três grandes conglomerados. Esse tipo de produto vai morrer como suporte para comunicação publicitária, porque ninguém vai esperar 24 horas para ler a notícia num jornal. A hard news continuará importante, mas o valor percebido nela, no sentido de gerar um modelo de negócios, será cada vez menor. Minha impressão é que caminhamos para a valorização do conteúdo contextualizado. Assim, creio que teremos produtos de mídia na linha da The Economist, com análise e contextualização. Não acredito que as organizações de mídia terão um modelo economicamente viável baseado na exploração de hard news. Esse vai ser um jogo para duas ou três companhias globais, que fornecerão para todo mundo.

GAZETA MERCANTIL – O senhor se refere a agências de notícias como AFP e Reuters, entre outras?

MARCELO COUTINHO – Provavelmente haverá uma concentração ainda maior entre elas. Já houve a compra da Reuters pela Thomson, por exemplo. Se por um lado há a tendência de concentração no conteúdo hard news, de outro há uma tendência de “capilaridade” da interpretação desse material, algo que é proporcionado pelas tecnologias digitais. Ou seja, muitas vezes são grupos de mídia menores, com equipes compostas por uns dez analistas que contextualizam aquelas notícias. Um exemplo interessante disso – não digo que seja modelo, mas apenas um exemplo – é o blog Huffington Post, da Ariana Huffington, nos EUA. Ela tem uma equipe renomada de especialistas. Esse grupo analisa os fatos para o blog. No auge da crise, em setembro de 2008, um banco americano de investimentos comprou 25% do Huffington Post por US$ 25 milhões. Trata-se de um blog avaliado em US$ 100 milhões. No mesmo dia em que li essa notícia, vi a cotação de alguns grupos regionais de mídia dos EUA na Bolsa de Valores. Muitos valiam menos que o Huffington Post. Eram companhias com 16 jornais locais e estações de rádio valendo menos que um blog. E você poderia perguntar que empresa é essa que poderia se beneficiar desse cenário. Seria um aventureiro, o Zorro? Não. As organizações de mídia tradicional ainda estão repletas de profissionais talentosos, experientes e que entendem como ninguém a importância de um bom conteúdo.

GAZETA MERCANTIL – Qual o papel dos jornalistas nessa nova configuração?

MARCELO COUTINHO – Respondo a essa pergunta com uma historinha comum nos anos 1990. Na época, dizia-se o “conteúdo é rei, ninguém entende mais de conteúdo que as empresas de mídia, então dominaremos o século XXI”. Mas nos esquecemos do seguinte: para as pessoas terem acesso ao conteúdo, elas precisam chegar a ele. E a forma como elas o alcançam não é só mais o caminhão que entrega o jornal e a revista, mas também os softwares e hardwares de grandes grupos de telecomunicações. Isso mostra que novos integrantes entraram na cadeia da informação, o que provoca um rearranjo de valor. Além desse aspecto, houve uma explosão de conteúdo disponível. E aqui vale a lei da economia: quanto maior a disponibilidade de um bem, menor o seu preço. Há um deslocamento da geração de valor. Quando vivíamos num mundo de conteúdo escasso, todo a informação produzida era consumida. A lógica hoje é outra. Como vivemos num mundo de conteúdo abundante, as pessoas consumirão aquilo que for organizado de uma maneira lógica para elas, consumidoras. O valor do conteúdo deixa de estar totalmente concentrado na produção e distribuição – as receitas das empresas de mídia vinham daí – para a ser gerado também na organização dele. Pelo sistema tradicional, as companhias cobravam um preço para criar e distribuir, algo que era pago pelos anunciantes, que queriam falar com os respectivos consumidores. Todo o valor vinha daí. Num mundo de explosão do conteúdo, o consumidor não dá conta de tudo isso. Assim, ele começa a ver valor em quem organiza a informação para ele. Os blogs tentam se firmar com um agente nesse processo. Como não temos tempo de dar conta de filtrar tudo o que acontece e chegar a uma conclusão sobre o que é socialmente valioso para nossa rede de relacionamentos, vamos aos blogs de fulano e beltrano, que podem tanto ser jornalistas de mídia tradicional como comentadores independentes. Por confiar na capacidade de filtro de determinado blogueiro, a pessoa lê o que ele escreve. E leva as informações para a sua rede social – para o Twitter, por exemplo.

GAZETA MERCANTIL – A maior demanda por análise decorreria disso?

MARCELO COUTINHO – Sim. Está no poder da filtragem.

GAZETA MERCANTIL – E como os veículos podem gerar receita nesse cenário?

MARCELO COUTINHO – Essa é a grande questão. A indústria não sabe muito bem como fazer isso. O mercado busca no momento métricas para mostrar para quem sustenta o processo – os anunciantes – que a “filtragem” dá retorno. As empresas de mídia ainda não conseguiram isso. Mas essa transformação virá, porque vem de pressão do consumidor. Tudo o que lemos sobre a situação dos grupos de mídia, especialmente nos EUA, com fechamento de jornais ou migração para o on-line, é motivado por essa realidade. Esse processo não é como um tsunami, mas sim uma maré que vai subindo, subindo. Não há como fazê-la recuar.

GAZETA MERCANTIL – Diante desse contexto, qual deve ser o perfil de um jornal impresso?

MARCELO COUTINHO – Também caminha para a análise.

GAZETA MERCANTIL – Aproximaria-se assim do perfil de revista?

MARCELO COUTINHO – Bom, ingressamos agora num terreno complexo. Não sei se o jornal diário – distribuído todos os dias, é bom salientar – fará muito sentido daqui a dez anos. Talvez passem a ser distribuídos dia sim, dia não. Mas veja que a notícia hard news continuará importante. Basta ver os jornais gratuitos. As pessoas colocam a mão para fora do ônibus para pegar o exemplar. Mas elas não estão mais dispostas a pagar por isso. Se os jornais pagos se tornarem mais analíticos, será necessário um novo perfil de jornalista e uma nova maneira de garantir a viabilidade econômica dessa operação. Talvez seja o caso de cobrar mais caro do anunciante, porque o jornal conseguirá atingir um grupo pessoas cujo envolvimento com o conteúdo será muito maior.

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Sobre o debate “novas e velhas mídias”, o Arena publica a série “O futuro da mídia: blogs ou impressos” – debate entre dois intelectuais de mídia, publicada em “Prospect.org”.

 

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Novos caminhos para os impressos

Por Nonato Viegas

Colunista do “New York Times”, Frank Rich escreve que se os grandes jornais fecharem não haverá “news” para o “Google News”, “a menos que o Google pague por elas.”

Mas, no “Washington Post”, Howard Kurtz responde que o Google talvez pague.

Segundo Kurtz, publisher Donald Graham já conversa com o presidente do Google, Eric Schmidt, “sobre uma possível colaboração” que incluiria “novas páginas na internet” e ferramentas para jornalistas e leitores.

Diz que Philip Bennett, executivo do “WP”, disse: “Conversamos sobre novas maneiras de criar e apresentar notícias. Uma colaboração informal que já produziu idéias interessantes”.

A proximidade de Google e os veículos tradicionais coincide com o crescente questionamento quanto aos direitos autorais.

Por outro lado, Robert Thomson, editor-executivo do “Wall Street Journal”, de Rupert Murdoch, adiantou o projeto em desenvolvimento na News Corp. para o futuro dos jornais, em entrevistas a Reuters e “Financial Times”.

Diz que vem aí um “sofisticado serviço de micropagamentos” para “quando tivermos seus dados, seremos capazes de cobrar segundo o que você lê, em especial, um alto preço por material especializado” (se sobre energia, commodities e gestão de fortunas).

Anuncia também “entrar em cada uma das grandes cidades” dos EUA, por ver “oportunidade” no enfraquecimento e fechamento dos jornais locais. Já iniciou campanha de marketing em Detroit e San Francisco.

Sobre o debate “novas e velhas mídias”, o Arena publica a série “O futuro da mídia: blogs ou impressos” – debate entre dois intelectuais de mídia, publicada em “Prospect.org”.

 

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O futuro da mídia: blogs ou impresso?

Por Nonato Viegas

Um é Steven Johnson, autor de “The Invention of the Air” (A Invenção do Ar) – sai no segundo semestre no Brasil – e “Cultura da Interface”, da ed. Zahar; e coordena o site “Outside.in”. Já foi editor-chefe e cofundador da “Feed Magazine”. O outro, Paul Starr – professor de Sociologia na Universidade Princeton (EUA), ganhou o Prêmio Pulitzer de não-ficção em 1984 por “The Social Transformatin of American Medicine” (A Transformação Social da Medicina Americana) e é fundador e coeditor da revista “American Prospect”, de onde saiu o debate que postaremos a partir deste post.

A tradução é de Clara Allain, da “Folha de S.Paulo”.

Ambos debatem, via e-mail, a mídia (impressa e web) como espaço de fomentação da cidadania e seu futuro. A resposta deste e-mail, o Arena publica amanhã.

6 de abril de 2009

Prezado Paul,

Comecemos pelos pontos sobre os quais provavelmente vamos concordar. Em primeiro lugar, os jornais historicamente forneceram e fornecem bens cívicos e públicos essenciais para uma cultura democrática saudável.
Em segundo, os jornais se encontram em situação financeira difícil, em razão de transformações de longo prazo operadas em grande medida pela internet, também em razão da crise econômica –que esperamos ser de curto prazo– e, no caso de alguns jornais, por decisões financeiras insensatas de seus proprietários.

Sejam quais forem as causas subjacentes, porém, acho que você e eu concordamos que, dentro de cinco ou dez anos, o setor dos jornais –e, portanto, seu produto editorial– terá aparência fundamentalmente diferente da atual.

A dúvida é se vai ou não emergir um novo modelo que forneça os bens públicos antes garantidos pelos jornais por meio de seus monopólios locais que geravam alta margem de lucro (pelo menos nos EUA).

Acho que existem boas razões para pensar que o sistema de notícias que está se desenvolvendo on-line será melhor que o modelo dos jornais com o qual convivemos nos últimos cem anos.

Uma maneira de enxergar essa transformação é pensar na mídia como um ecossistema.

Na maneira como ela circula a informação, a mídia de hoje é, de fato, muito mais próxima de um ecossistema do que era o velho modelo industrial e centralizado da mídia de massas.

O novo mundo é mais diversificado e interligado –é um sistema no qual as informações fluem com mais liberdade. Essa complexidade o torna interessante, mas dificulta as previsões de como será sua aparência dentro de cinco ou dez anos.

Em lugar de começar pelo futuro, proponho que olhemos para o passado. Quando os ecologistas pesquisam os ecossistemas naturais, procuram as florestas mais antigas, onde a natureza teve mais tempo para evoluir. Para estudar as florestas tropicais, eles não analisam um campo desmatado dois anos antes.

Por analogia, devemos examinar as partes do noticiário on-line que passaram por uma evolução mais longa.

Uma dessas áreas é a reportagem sobre a própria tecnologia. Esta vem crescendo e se diversificando há décadas, fazendo dela uma floresta antiga de notícias on-line.

Por qualquer medida, esse campo hoje é imensamente mais informativo do que era quando comecei a acompanhar questões ligadas à tecnologia, no final dos anos 1980, ainda estudante universitário.

A web não possui uma aptidão intrínseca para cobrir a tecnologia –ela apenas tende a cobrir a tecnologia em primeiro lugar porque as primeiras pessoas que usaram a web eram mais interessadas nessa área.

Mas isso mudou e está continuando a mudar. A transformação do deserto do noticiário de tecnologia dos anos 1980 na rica diversidade da cobertura feita hoje está acontecendo em todas as áreas do noticiário.

Ela está aqui, mas, como no ditado de William Gibson em relação ao futuro, ainda não está distribuída de maneira igual.

Tomemos a política como outro exemplo. A primeira eleição presidencial que eu acompanhei de maneira obsessiva foi em 1992. Todo os dias o “New York Times” publicava um punhado de matérias sobre escalas nas campanhas, debates ou pesquisas de opinião.

Todas as noites eu assistia a programas da televisão a cabo como “Crossfire” para ouvir o que os palpiteiros tinham a dizer sobre os acontecimentos do dia. Eu lia “Newsweek”, “Time” e “The New Republic” e vasculhava a “New Yorker” em busca de seus ocasionais artigos políticos. Quando os debates presidenciais eram transmitidos, eu assistia religiosamente, ficando acordado até tarde para ouvir os comentários dos especialistas reunidos.

É verdade que tudo isso estava longe de constituir um deserto de noticiário. Mas compare-se o que havia então com as informações disponíveis na eleição de 2008.

Tudo que existia em 1992 ainda estava presente, mas fazia parte de uma nova e vasta floresta de notícias, dados, opiniões, sátira –e, o que possivelmente seja mais importante, experiências diretas.

Sites como Talking Points Memo e Politico faziam reportagem direta. Blogs como o Daily Kos traziam relatos aprofundados sobre corridas individuais, algo que o “New York Times” jamais teria tinta suficiente para cobrir.

Blogueiros como Andrew Sullivan reagiam a cada nova virada no ciclo noticiário, e novos analistas como Nate Silver, no Fivethirtyeight.com, faziam análises de pesquisas que superavam de longe qualquer coisa oferecida pela CNN.

Quando a economia implodiu, procurei os blogueiros econômicos, como Brad de Long, e assisti aos debates com mil amigos virtuais tweetando a meu lado no sofá. Tudo isso era remixado por meio das sátiras de Jon Stewart e Stephen Colbert, visto em clipes virais na internet tanto quanto na televisão.

Podemos ver a mesma paisagem em mutação no Reino Unido, onde o blogueiro Guido Fawkes, que não é repórter de jornal, vazou os e-mails que levaram à renúncia do assessor de imprensa de Gordon Brown.

E há mais: o ecossistema de noticiário político incluía informações dos próprios candidatos. Pense no discurso de Barack Obama sobre a questão racial, possivelmente um dos acontecimentos-chave da campanha. Oito milhões de pessoas o acompanharam no YouTube.

Teriam as redes de TV transmitido esse discurso na íntegra em 1992? Com certeza não. Ele teria sido reduzido a um minuto no noticiário noturno. A CNN talvez o tivesse transmitido ao vivo, para 500 mil pessoas. A Fox News e a MSNBC nem sequer existiam.

Para mim, não há dúvida alguma que o ecossistema do noticiário político em 2008 foi muito, muito superior ao de 1992. Alguns podem apresentar o argumento da “câmara de ecos”, dizendo que as fontes que cito têm viés político.

Mas mesmo isso soa suspeito. Afinal, em 1992 eu lia apenas o “New York Times” e o “Nation”. Já em 2008, passei horas lendo a conservadora “National Review” on-line. Ainda era uma “pesquisa junto à oposição”, mas o fato é que essas visões de direita estavam a apenas um clique de distância.

Algumas pessoas argumentam que essa nova diversidade é parasítica: os blogueiros são interessantes, é claro, mas, se as organizações noticiosas tradicionais perdessem peso, os blogueiros não teriam mais sobre o que escrever.

Isso talvez fosse verdade no início desta década, mas não é mais. Imagine quantos barris de tinta foram comprados para imprimir comentários em jornais sobre a gafe de Obama em relação a “pessoas que se apegam a suas armas e à religião”.

Mas essa frase não foi reportada originalmente pelo “New York Times” ou o “Wall Street Journal”, e sim pelo Huffington Post. É possível, é claro, que grandes jornais nacionais, como o “Times”, possam acabar florescendo nesse novo ambiente. Mas a sala de briefing da Casa Branca vai ficar mais e mais cheia. Não é que os jornais irão desaparecer –é apenas que deixarão de ser a espécie dominante.

A cobertura política da campanha de 2008 foi fértil pelas mesmas razões por que a cobertura das notícias na web é fértil: porque a web já é uma mídia de crescimento antigo.

As primeiras ondas de blogs eram focadas na tecnologia; mais tarde, se voltaram à política. A cobertura política em estilo “web 2.0” já teve uma década para amadurecer e chegar a seu estado atual.

Agora a mesma coisa está acontecendo com a cobertura de esportes, economia, cinema, livros, restaurantes e notícias locais –todas os temas padrões do velho formato dos jornais estão proliferando on-line. Há mais perspectivas e mais profundidade.

E isso é apenas o crescimento mais recente. As notícias on-line estão apenas começando a amadurecer.

Cordialmente,

Steven

‘Folha’, ‘Estadão’ e ‘O Globo’ desabam

Por Nonato Viegas

Se “Folha de S.Paulo”, “Estadão”, “O Globo”, “Extra”, “Correio Braziliense” e “Jornal da Tarde” já estavam em alerta, o primeiro trimeste de 2009 fez soar o sinal vermelho.

Seis (“Folha”, “Estadão”, “O Dia”, “Diário de S.Paulo”, “Correio Braziliense” e “TJ”) dos 20 maiores jornais brasileiros tiveram a pior circulação da década. “O Globo” e “Extra” só não entram para o clube da crise, porque já tiveram períodos piores (2003 e 2004), mesmo assim, também caíram muito.

No Rio Grande do Sul, o “Correio do Povo” alcançou a segunda pior circulação desde o ano 2000.

Dados do IVC (Instituto Verificador de Circulação) mostram que a “Folha” fechou o primeiro trimestre de 2009 com média diária de 298.351. No começo de 2000, essa média era de 429.476. Já o “Estadão” caiu de 391.023 para 217.414, na mesma comparação.

“O Globo” também em crise, viu a média diária cair, em 2000, de 334.098 para 260.869, nos três primeiros meses de 2009. Seu resultado é superior apenas a dois outros anos dessa década: 2003 (com 258.485) e 2004 (250.480).

O “Extra” – também dos Marinho – registrou média diária de 264.715, no ínicio do ano 2000 e chegou a apenas 258.324 em 2009.

Em São Paulo, o paulistano popular “Diário de S. Paulo” – das Organizações Globo – fechou o primeiro trimestre deste ano com média de 61.088. Em 2000, quando se chamava “Diário Popular” e não pertencia aos Marinho, chegou a 151.831.

Outro concorrente direto, o “Jornal da Tarde” – Grupo Estado -, caiu de 58.504 para 50.433, no mesmo período.

Circulação de jornais cresce no Brasil, segundo IVC

“O crescimento dos jornais [no Brasil] tem basicamente dois motivos: o bom momento econômico do país, que resulta na expansão do mercado consumidor de informações, e a melhor saúde fincanceira das empresas de mídia”.

Murilo Bussab, diretor de circulação da “Folha de São Paulo”.

 

NO 1º SEMESTRE, O CRESCIMENTO FOI DE 8%;

Em média, 4,39 milhões de exemplares circularam diariamente no país nos primeiros seis meses deste ano, informa o Instituto Verificador de Circulação (IVC). No ano passado, foram 4,06 milhões.

O mês de junho também apresentou alta: 5,3%, em relação ao mesmo período de 2007.

Na média semestral, a “Folha de São Paulo” lidera, com média de circulação de 317,3 mil exemplares; seguido do “Extra” do Rio (315,2 mil); e “Super Notícia”, de Minas (301,3 mil).

Já em junho, o “Super Notícia” (MG), “O Globo” (RJ) e “Estado de São Paulo” (SP) passam o “Extra”.

O presidente da IVC, Pedro Martins da Silva, explica que o “desempenho do mercado de jornais contraria previsões negativas feitas no início da década. A expectativa era a de que o fornecimento de conteúdo pela internet resultaria numa redução do consumo de jornais”. Para Da Silva, “isso não aconteceu e não deve acontecer devido à credibilidade do conteúdo dos jornais, como mostram os números do setor”.

 

Ranking do primeiro semestre

1º “Folha de São Paulo” > 317.350

2º “Extra” (RJ) > 315.246

3º “Super Notícia” (MG) > 301.362

4º “O Globo” (RJ) > 281.823

5º “O Estado de São Paulo” > 257.810

6º “Meia Hora” (RJ) > 222.863

7º “Zero Hora” (RS) > 177.950

8º “Diário Gaúcho” > 166.745

9º “Correio do Povo” (RS) > 153.916

10º “Lance!” (RJ) > 122.503

Jornais tem pior receita publicitária, diz ‘NYT’

O portal Blue Bus conta da notícia postada pelo jornal “New York Times” de que os jornais estão “diante do pior ano em receita publicitária”.

Refere-se à previsao de queda de dois digitos na receita com publicidade e diz que o quadro “levanta sérias dúvidas a respeito da sobrevivência de alguns jornais e a saúde financeira das empresas controladoras”.

A publicação detalha com numeros que, em 2007, a queda foi de quase 8%. Este ano, a receita publicitária está cerca de 12% abaixo do resultado ruim do ano passado. “Os jornais reduziram custos cortando milhares de vagas, eliminando algumas rotas de distribuiçao e imprimindo menos, ou em formatos menores – mas as margens de lucro continuam encolhendo”, diz.

No Brasil, ao contrário, os jornais brasileiros apresentam crescimento: 11,8%, em 2007, segundo a ANJ (Associação Nacional de Jornais). A participação no bolo publicitário aumentou: 23,72%.

Nonato Viegas